ou O segredo que abre as portas
Desde a Revolução Francesa, mais concretamente desde a vitória do liberalismo, na primeira metade do século XIX, que temos assistido, apesar da crise, a uma consolidação segura do poder económico nas sociedades nos países desenvolvidos. Pode dizer-se que a história a seguir à II Grande Guerra se resume, do ponto de vista político, à subjugação das sociedades aos interesses económicos.
A tendência é para que tudo seja dominado pelo poder económico, desde a política à justiça, passando pela comunicação social.
Não temos censura nem falta de liberdade para podermos expressar livremente os nossos pensamentos. O que existe é a manipulação da comunicação social. Uma manipulação sem rosto, que adopta métodos maquiavélicos, para alcançar os seus objectivos. E, como sabemos, a manipulação nunca é feita por bons motivos e para servir uma causa nobre. Não, a manipulação só serve interesses pouco transparentes e é inimiga do esclarecimento e de uma sociedade mais bem informada.
A manipulação é a violação da liberdade. Ela impõe a supressão de toda a dimensão crítica da parte de quem é manipulado, e a aceitação de tal acriticidade da parte de quem manipula.
Uma vez garantida a subserviência dos media, é fácil manipular as opiniões e o sentido de voto dos cidadãos. A oligarquia perpetua o seu poder e as vítimas desta violação nem sequer se apercebem do que está a acontecer, a menos que algo surja de importante, que impeça continuar a anestesiar a opinião pública.
O segredo para abrir a porta da manipulação é a coragem e o sentido do interesse público bem apurado. E só porque a manipulação perdeu é que os portugueses conseguiram conhecer o segredo guardado atrás da porta. Conseguiram saber a estratégia montada, por alguns meninos ainda com dentição de leite, para alguma comunicação social; conseguiram perceber que quando estamos no domínio dos indícios criminais não existe, ainda, prova, como, por erro, disse Noronha Nascimento; foi possível saber da existência administrativa de umas certidões e não de um processo; foi possível saber que quem despachou em certidões e não abriu um inquérito violou a lei; foi possível saber que basta o material escutado e não todos os restantes elementos para saber da consistência dos indícios; foi possível saber que não existe violação do segredo de justiça porque não existiu um inquérito; foi possível saber que quem apresentou a denúncia ficou impedido de reagir por causa dos despachos administrativos e da falta de inquérito.
O manipulador não entende aquela velha frase da democracia: "Eu detesto o que tu dizes mas bater-me-ei para que tu tenhas liberdade para dizeres o que dizes".
Rui Rangel, Juiz Desembargador
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